sábado, 28 de fevereiro de 2009

Meu irmão e eu


Um dia, depois de muito adiar a “confissão”, meu irmão finalmente tomou coragem:

- Mãe. É que eu fico com pena da Bíbi. Mas a verdade é que eu não gosto mais de brincar de Playmobil.

Eu sou a caçula, três anos e meio mais nova. Somos só nós dois. E só Deus sabe como eu aluguei meu irmão nesta vida. Caçulas alugam.

Minha mãe já sabia que ele não gostava mais de brincar havia muito tempo. Mas eu era tão empolgada com as brincadeiras, e tínhamos um nome e uma profissão e uma família e um plano de vida esquisito para cada Playmobil, e construíamos cidades, planejávamos viagens, elegíamos líderes, apostávamos corridas - tudo isso no chão do nosso quarto, dias e noites a fio, até a hora de reclamar porque deveríamos dormir.

Decerto ele ficava me olhando e pensando: mas ela ainda curte tanto, como é que eu vou desmontar essa coisa imensa que eu mesmo ajudei a construir? Deixar a guria perguntando e respondendo sozinha, tem graça?

Nisso ele tinha toda a razão: não tinha graça nenhuma brincar sem ele. Tanto é que, depois que os Playmobil se aposentaram, perseguimos os mesmos interesses (música, música), embalamos nossos sonhos e planejamos nosso futuro no mesmo tom, fizemos as malas e fomos morar juntos em outro estado. Meu irmão e eu. E até hoje eu penso que alguns bairros de distância entre nós são um exagero sem precedentes, deveria existir um tapete mágico, uma flauta encantada ou uma motoca de Playmobil que automaticamente nos transportasse para o chão do nosso quarto, plim!, seríamos crianças outra vez, e eu seria a caçula mala que pergunta o que vem depois do número mil.

PS: Pesquisando sobre os bonecos, fiquei sabendo que morreu, no dia 30 de janeiro passado, o desenhista industrial alemão Hans Beck, considerado o “pai” do Playmobil. Aos 79 anos. Valeu, Hans.
Daqui.

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Curso de bebê - flashback

O texto abaixo é dedicado à MT, grávida de 27 semanas, e ao Caetano, que deve estrear neste mundo em maio.

Foi extraído do meu outro blog, do tempo em que eu estava grávida, mais ou menos na mesma fase da MT hoje. E, como ela, levemente ansiosa.

PS: No fim, tudo dá certo. Dá, sim.

Histeria e Curso de Bebê

Vamos fazer um curso de bebês. Dois sábados seguidos, na maternidade onde vou ter a Lara. Ai, meu Deus. Um curso de bebês.

- O segundo sábado será sobre os cuidados com o bebê, até ele completar um aninho – a moça me explicava por telefone.

Ai, meu Santo Cristo. Um aninho.

- Vamos ensinar como dar banho... Será usada uma boneca como modelo.

Ai, Jesus. Uma boneca como modelo. Já estou me vendo afogando a tal boneca na banheira - e as outras futuras mamães me lançando olhares de reprovação, olha lá a falta de jeito em pessoa, coitada, desastrada, estabanada, mal consegue dar banho na boneca-modelo, o que será da filha? E eu confundindo o bebê com o sabonete, esfregando o maior no menor, a água espirrando, a criança pulando para fora da banheira enquanto eu tento pescá-la no ar pelo pescoço, inutilmente, entre risadas espasmódicas e franco desespero.

- Rá!! Te peguei!

Peguei nada. Agora a boneca-modelo, ainda mais contrariada, já foi parar no colo do marido alheio, um bigodudo de bermudas floridas e unhas mal cortadas que veio do Panamá tocar percussão numa banda chinfrim e se encantou pela loira rebolativa que bebia cerveja quente na primeira mesa, ela piscava porque tinha cacoete mesmo, mas ele achou que era paquera e lhe pagou uma casquinha de siri – pronto, deu no que deu.

Povo engravida pelos mais variados motivos, impressionante.

Está bem, dá para perceber que estou me sentindo um pouco ansiosa. É verdade. Hoje liguei para a minha mãe.

- Tô ficando histérica.

- Calma, filha. Uma coisa de cada vez. É só organizar os pensamentos.

- Tá.

Pausa.

- Mãe... Agora estou histérica em ordem alfabética. Resolveu muito, não.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Dois anos: a primeira travessura

É de lascar. Hoje nós duas tomamos o café normalmente. Quando a babá chegou, ela quis sair da cadeira e fazer uma farra. Mas a babá precisava trocar de roupa, e ela já ia correndo atrás quando eu disse:

- Filha, vem cá que a mamãe quer te mostrar uma coisa no...

E ela, agarrada às pernas da Tina:

- Minha mamãe é a Tina!!!

Assim, na lata. Pobre da Tina, levou um susto e foi logo se explicando: “eu nunca disse isso a ela!”. E eu sei que não faria mesmo.

Menina, menina. Mal você fez dois anos e já me apronta essa. Se eu não tivesse acordado com um ótimo humor, se não tivesse dormido as regulares 8 horas, se meus hormônios estivessem enfrentando aquela ordinária situação mensal que todas nós conhecemos... Provavelmente, eu estaria desabafando no blog, em tons pastéis humorísticos, como se tudo isso não passasse de gaiatice literária numa manhã de terça-feira torta.

Filho é assim, quase uma questão fisioterápica. A gente estica e puxa para andar reta, na medida do possível, porque o solavanco é tão imprevisível quanto certeiro. Que mais?

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Dois anos. Que mais?

Filha

Fiquei pensando no que eu queria te dizer nesse aniversário de dois anos, mas que hoje você ainda não entenderia.

Não sei o que dizer. Tudo que é importante na vida você já conhece – o amor, o afeto, a alegria. Até de dor você já entende; sentiu no pezinho, depois uma picada no bumbum, pressão no dentinho, e quando algum de nós saiu de casa e não deu para levar você junto. Soprou, passou, depois veio outra vez. E soprou, passou, de novo. Que mais?

“Que mais?” – é assim que você pergunta quando alguém diz qualquer coisa pela qual você se interessa. “Que mais?”, e a fantasia começa a desfilar seus blocos infinitos.

Você já sabe andar, falar, pular, correr, pedir, reclamar, protestar, gritar, comer com a colher e beber água no copo. Que mais? Já andou desenhando as suas baleias. Regeu alguns concertos (na TV) com seu pai, escreveu diálogos no computador com a sua mãe.

“Que mais?” – esse é o seu jeito de não acabar, de não romper o contato, não aceitar um ponto final. Se posso dizer alguma coisa importante, digo logo: conserve a curiosidade e o desejo de conhecer, descobrir, ir adiante, sempre além. Que mais? Que mais?

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

A maternidade em grãos

Mamãe tá de ptó!
(Eu estava de top.)

Mamãe tá boniiiiiita!
(Eu estava alegre. Fiquei mais.)

O cabelo da mamãe tá torto.
(Eu pego aquele #!@&(%$ que tosou meu ex-cabelo reto!)

Quanta bagunça a Tina fez aqui!
(O quarto todo revirado, e pondo a “culpa” na babá...)

O papai chegou!!!
(Detalhe: chegamos os dois juntos, e eu apareci primeiro, abri a boca e os braços, fiquei agachada em ridícula pose deixa-que-eu-chuto... Mas ela só teve olhos para o papai, mamãe era de vidro.)

Olha o barrigão da mamãe aqui!
(E a mamãe, que estava de “ptó” (top), tomou juízo e vestiu logo uma bata.)

***

Agora, falando sério. É muito interessante notar como as crianças são observadoras, atentas aos detalhes e extremamente críticas. Ser mãe e ter uma natureza tímida é desconcertante, e é um desafio que se instala de forma tão gradual, sutil e definitiva (como tudo na maternidade, aliás) que a gente passa a se reconhecer nisso também. Faz parte. Agora eu sou uma tímida observada, questionada e imitada, quer queria ou não, e não sou eu quem dá a medida em nada disso.

Ninguém acorda mãe. Aquilo que a gente vê no hospital é um projeto de família, mas todo mundo está meio grogue e ninguém tem experiência suficiente sequer para encarnar o papel que lhe caberá pelo resto dos dias. Assim que cheguei em casa - e percebi que minha mãe ficaria, mesmo, uns dias aqui para me ajudar -, abri um berreiro espalhafatoso e acho que nunca fui tão filha em toda minha vida. Primeiros dias de mãe.

Depois, você agrega certos elementos conforme o bebê vai crescendo. Aquilo vai sendo incorporado à rotina e - não é exagero dizer – também à sua personalidade. É uma formação contínua, uma via de mão dupla de aprendizado, conhecimento e reconhecimento, estranhamento e identificação, agonia e amor profundo. Na versão sem cortes, naturalmente.

Outro dia, entrei no quarto dela mastigando um último farelinho de biscoito. Como não era hora de ela comer biscoito, tentei disfarçar dizendo alguma bobagem qualquer, perguntei se ela queria ir não sei aonde. Ela nem esperou terminar minha frase, já emendou:

- Mamãe tá comendo o quê?

Ora, as crianças possuem um detector de farelos, é tão óbvio! Como pude pensar que conseguiria esconder a minha travessura entre os dentes? Felizmente, um bocado de criatividade e jogo de cintura podem nos salvar nesses momentos, é só não deixar o farelo entalar no entendimento.

- A mamãe não está comendo alface. A mamãe não está comendo brócolis. (Não menti, mas também não pronunciei nenhuma palavra que despertasse um desejo incontrolável nela, como “biscoito”). Agora, vamos andar de motoca? (Uma vez resolvida a questão alimentar, botei a motoca na jogada e despistei a gula. Ufa.).

Nem sempre é assim. Muitas e muitas vezes, saio-me razoavelmente, e depois vou me esconder no banheiro a alfinetar considerações teóricas em mim mesma, como se tivesse a obrigação de ter me saído melhor, afinal, eu me preparei e li tanto a respeito, e tive minha filha já aos 29 anos, e tenho uma estrutura familiar tão bacana, blá, blá, blá.

O conhecimento – via intelectual - pode até vir em blocos, mas a maternidade é em grãos. E a paciência, que tanto se anuncia ser indispensável em relação aos filhos, é artigo fundamental de uma mulher consigo própria, e do homem idem, caso queiram ser pais razoáveis e manter os cabelos intactos, a consciência tranquila - essas coisinhas que parecem mal fazer diferença no nosso dia-a-dia (um estresse aqui, uma briguinha boba ali), mas acabam norteando os caminhos e definindo, afinal de contas, o modo com que escolhemos viver a vida.

O lado bom do grãozinho é que ele vira o chão que a gente pisa. E o lado difícil também.

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Bagunça acelerada

Uma graça esse video de um bebê de 9 meses fazendo bagunça em casa. O pai filmou quase 4 horas de "caos" na sala, e depois condensou em pouco mais de 2 minutinhos.
Querida, encolhi o tempo. Pior é que eles crescem rapidinho assim.



Essa dica foi visitada aqui, que visitou aqui.

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Babá com dengue

Não costumo deixar de publicar aqui por tanto tempo, mas aconteceu um imprevisto: a babá da minha filha não apareceu na semana passada inteira e, até onde eu sei, é suspeita de dengue. Tadinha!

Estou mãe full-time, 100% cuidados e carinhos. No primeiro dia, achei lindo quebrar a rotina - fomos, nós três, passear no shopping, comer bobagem e olhar as liquidações, enquanto ela corria, de um lado para outro, aos gritinhos irresistíveis de "vamos na escada! Vamos na escada!". A rolante, claro. Tudo azul, a mil.

No segundo dia, já sentindo uma puxada na lombar e não tendo dormido direito (pensando no que deixei por fazer e na falta de notícias da babá), ainda me armei de coragem. Sinceramente, ponderei que, se ela não viesse, seria mais uma oportunidade de curtir a minha filhota. E que se danem os trabalhos, compromissos, ginástica e salão! Tudo pode esperar, pensei.

E nada da babá. Depois do almoço, dei o banho nela e já comecei a bufar uma oitava acima. E, depois disso, já não me lembro mais da ordem dos acontecimentos. Só sei que, no terceiro dia sem babá, pedi a valiosa ajuda dos meus pais, que vieram buscá-la para dormir lá e a trouxeram no dia seguinte, faceira da vida, cheia de uma energia inesgotável e contagiante. Deu saudade da pequena, sim, mas só assim consegui cuidar de alguns detalhes tão simplórios (e essenciais) que nem vale a pena citar aqui.

Pela ausência de notícias, estou supondo que houve a confirmação da dengue. Deus queira que tenha o tratamento adequado, e que retorne o quanto antes a este bagunçado lar. Bagunçado, porém feliz.