nós ontem fomos à piscina de manhã. Brincamos, gargalhamos, pulamos, corremos e explodimos em “tibum!” várias vezes.
Pai
Ele inventou uma brincadeira: jogava-a para cima e deixava “cair” na água de volta, estourando num sonoro “tibum!” que ela, excitadíssima e aos gritinhos, comemorava e pedia bis.
Parênteses: é claro que eu aproveito e me divirto, mas permaneço sempre me preocupando com calor, frio, chinelos, toalha, a hora do almoço, e até com as minhas pernas branquelas, incompatíveis com a região e a estação. É feio, sei, mas tenho uma inveja danada dos homens e de como se divertem despreocupadamente, essa é a palavra.
Ela estava de bóias nos bracinhos, e não era uma queda do tipo mergulho, porque ela ainda não mergulha. Apenas a farra, uma adrenalina calculada, promovida por um pai de carinho e disposição incalculáveis, como são os papais. Ou como todos podem ou desejariam ser ou ter sido. Quem teve um pai assim sabe como é; você guarda dentro de si uma espécie de aprovação contínua e, toda vez que ousa se divertir para valer – e sente algum medo, hesitação, ou não sabe se realmente merece -, um calorzinho interno faz que sim. Esse calorzinho é o “tibum!” da vida inteira, estimula e faz andar para frente.
Lógico, estou aqui observando a paternidade de uma poltrona absolutamente feminina e tão subjetiva - a menina que fui e a mãe que me tornei. Não é que os pais (todos) sejam mais soltos e despreocupados que as mães, e não é que as mães não estimulem seus filhos e não tenham o seu próprio modo de instalar a aprovação contínua dentro deles. Pelo contrário. Mas o “tibum!” materno é sempre tão falado, escrito e ilustrado que não consigo deixar de me voltar para a experiência da maternidade vista de dentro – diferente de tudo que eu imaginava até o último dia de gestação. Particularmente, não sinto como algo grandioso, extravagante, meteórico, heróico ou metafísico; acho que é observar e observar. Vista de dentro, a maternidade é muito mais para fora, mas é o “para fora” mais perto que jamais conheci.
Contradição
E dizem que as mulheres são confusas e contraditórias, então vou desdizer uma parte do que acabei de dizer sobre os homens/pais para mostrar que eles são iguaizinhos a nós.
Meu pai era e é, definitivamente, um homem com “tibum!”. Ao mesmo tempo, contudo, tinha uma preocupação excessiva (do meu reles ponto de vista infantil, claro) com certas condições higiênicas como o tamanho das unhas. Tanto que resolveu assumir a função de pilotar a tesourinha, e o que lhe sobrava em rigor higiênico faltava em habilidade motora, resultado: corríamos daquela tesoura como diabo da cruz, porque a aflição era certa. Persistente e satisfeito, ele encerrava o serviço sempre com um sorriso no rosto e passava a nos perseguir pela casa para que não tocássemos em nada sujo, não levássemos as mãos à boca, e coçar os olhos era motivo para bronca. Ora, o mundo é sujo e os olhos coçam.
E tem outra coisa, minha mãe tem uma discreta mania de limpeza – que eu criticava na adolescência, naturalmente, e que me vejo herdando progressivamente à medida que o tempo passa, um caso tão comum e previsto em qualquer literatura. Meu pai e minha mãe concordam, dentro de mim, e me perseguem loucamente pela casa com tesourinha e desinfetante em punho, dizendo as maiores barbaridades jamais previstas na pior das literaturas.
Resumo da ópera: não há homem ou mulher que seja puramente qualquer coisa, porque a nossa cabeça hospeda pai e mãe em eterno conflito e tumultuada harmonia, pela vida afora, pouco ligando se a nossa pretensa razão considera isso relevante ou apenas lixo emocional. O importante é como lidamos com o suco que sai daí.
Nós duas
Na volta da piscina eu te dei um banho morno na banheira, e você, ao sair, chorou um choro tão necessário, o visível desabafo do cansaço. Não quis interferir naquela melodia, simplesmente te abracei e, naquela hora, não conseguiria imaginar ninguém em meu lugar; ninguém em seu lugar. Só nós duas. Calor, frio, toalhas, chinelos e a hora do almoço ficaram para depois.