domingo, 28 de junho de 2009

Medos infantis - estreia em grande elenco

À noite, estávamos só nós duas em casa. Acabei de dar o jantar, e ela foi comigo levar os pratos na cozinha. Na volta, sem perceber, eu vinha uns passos adiante dela, que me seguia em silêncio. De repente me provocou, com a voz risonha:

- Mamãe... Cuidado com o lobo...

Na mesma hora, querendo entrar na sua brincadeira, mudei toda a minha postura e curvei o corpo, como se estivesse apreensiva. Dei uns passinhos, espiando a curva escura que leva ao corredor, atrás do piano, e caprichei também na expressão facial (receio).

Quando achei que estava arrasando no teatrinho, percebi que havia uma menina congelada atrás de mim. Ela mal respirava. Ficamos alguns segundos quietas – perdi o tom! -, até que ela fez escapar, com um fiozinho de voz:

- Sou eu, mamãe...

Imediatamente, dei uma gargalhada involuntária, que ela respondeu com um pulo, tão assustada que me deu peninha e fui correndo abraçá-la.

- Sou eu, filhota... Não tem lobo nenhum.

Ela havia me proposto uma brincadeira, que eu aceitei na hora, sem restrições. Tomei aquela advertência (“cuidado com o lobo”) ao pé da letra, embarquei na fantasia. Mas fui uma atriz razoável demais, ao menos para uma criança de dois anos, e acabei trazendo o lobo à razão: assustei a menina!

Talvez ela esperasse que eu impostasse a voz e ameaçasse: “Ora, ora, seu lobo! Cuidado com a mamãe aqui, hein? Vou fazer picadinho de você!”. Ou que eu cantasse “quem tem medo do lobo mau?”, ou que abrisse o piano e mostrasse a língua para um lobo musical imaginado, mas evidentemente impossível. Então, isto estaria claro: o lobo é impossível.

Não estou querendo dizer que haja uma maneira certa de brincar, e que eu tenha agido “errado”. Até porque os filhos crescem algumas semanas e a imaginação se transforma, os sustos idem, e o nosso relacionamento vai sendo construído sem roteiros a partir dessa brincadeira gostosa e seriíssima que é educar.

Mas a historinha do lobo que eu ajudei a inventar é ilustrativa, e alguma coisa me diz que isso é só o início. Ao longo da vida a gente vai sendo chapeuzinho, caçador, lobo, anão, vovozinha, bruxa...

Ser mãe é ter capacidade imaginativa e muito peito (sem trocadilho), porque não há ensaio e já estreamos em grande elenco.

5 comentários:

Ju disse...

Demais, disse tudo!!!!

Angélica disse...

Verdade Bibi, sempre digo que precisa ter "peito", rsss. Ser mãe é mesmo uma arte, que a gente, com nossos medos também, vai descobrindo no dia a dia, ao lado de nossos pequenos professores.
Gostei muito do texto.
Beijos.

Anônimo disse...

Uau, grande imaginacao para um texto nota 1000.
Beijos nega

Anônimo disse...

Bibi, ser mãe realmente é uma arte diária.
Sou sua leitora assídua e inspirada no seu blog, comecei o meu.
Te convido a conhecê-lo.
bjs

Maura Fischer disse...

Ah! Tadinha!
Adorei o blog! Vou acompanhar as atualizações!
Bom final de semana!
Maura
(http://coisasdamaura.blogspot.com)