Uma amiga me contou que está pensando em engravidar. Acha que pode ser no fim do ano, ou não, ainda tem que refletir sobre alguns medos, conversar com o marido, fazer planos. Acendeu em mim uma luz colorida (vou ser “tia”!), mas depois comecei a pensar em algumas coisas para dizer a ela (luz amarela). E conselho é grátis, então vai aqui no blog para quem mais servir a carapuça.
Talvez porque eu não tenha planejado engravidar naquele maio de 2006 (tecnicamente, minha gravidez começou exatamente no domingo que foi dia das mães naquele ano - coincidência bonitinha), sempre fico pensando em como deve ser maravilhoso, seguro, produtivo e confortável programar a vinda de um filho. Logo eu, que abro uma planilha do Excel até para resolver quantas vezes por dia vou ali respirar na varanda, fico fula comigo mesma quando penso que deixei de curtir esta etapa do processo: prós e contras, pré-produção, orçamento detalhado, quadradinhos coloridos que dão ordem e racionalidade ao sonho. Teria sido tão melhor!
Por outro lado, uma parte de mim garante que eu ainda estaria debruçada em planilhas se a vida não tivesse me presenteado com o que eu julgava ideal para o momento de, finalmente, ser mãe: ter uma formação sólida, a carreira estável, a rotina tranquila e um casamento que nós dois desejássemos ser para sempre. Plim!, comercial de margarina.
Algumas dessas coisas eu conquistei hoje; outras ainda estão em processo. Mas posso garantir que o meu possível “filho planejado” ainda estaria engavetado em algum quadradinho do Excel neste exato momento, aguardando melhor oportunidade para nascer. E essa chance certamente seria adiada esse ano, porque penso em estudar mais um pouco, e para o próximo ano tenho planos de viajar, e no ano seguinte surgiria uma proposta irresistível que me tomaria um tempo danado, mas seria tão importante para a minha realização pessoal... Assim, sucessivamente, eu engravidaria de tantos projetos que não sei se haveria tempo ou disponibilidade para criar uma criança de verdade.
Por isso, vou dizer à minha amiga (já estou dizendo, ela me lê aqui) que tenha cuidado. Não penso que todas as mulheres devam passar pela experiência da maternidade, e, para aquelas que escolhem ser mãe, acho que deve haver um tempo de refletir, ponderar e então partir para o planejamento. Se a decisão for pelo “sim”, sou totalmente a favor das planilhas. Mas é bom ter atenção, porque a nossa geração cresceu enfileirando projetos pessoais e profissionais cujo objetivo principal era nos estabelecer na sociedade com a importância devida – uma conquista feminina apenas iniciada pelas nossas mães, mas que ainda requer muita dedicação pela frente. Acontece que não adianta muito você estudar, trabalhar e ler todos os jornais do dia para, ao chegar aos 30 e muitos, perceber que faltou um pedaço.
O outro perigo é a vontade de não crescer. É bom demais estar solta na vida, namorar sem compromisso e escolher o próximo destino de viagem com base no melhor apartamento entre os amigos que você conheceu pela internet. Mas o tempo vai passar de qualquer maneira, e achar que vamos segurá-lo pelas rédeas só porque não temos filhos ainda, desculpe. O próximo estágio é sentir-se madura, depois muito madura, depois tão madura que já não dará tempo de escolher.
E vamos às questões estéticas, tão em voga atualmente. Se está nos seus planos ser linda e gostosa enquanto seu fôlego e tônus permitirem, e pensa que engravidar ameaça suas curvas para sempre, boa notícia: é tudo besteira. Não são só as moças riquíssimas – que gastam um carro por mês em clínicas de estética – que podem recuperar o corpo que tinham antes da gravidez. Basta ter disciplina e fazer exercício que tudo retorna ao tamanho original, e pode até melhorar.
Retomando: o conselho só vale para aquelas que realmente querem ter filhos, e já não têm 20 e poucos anos.
Herdei da minha mãe uma auto-exigência surreal e a tendência a tomar decisões privilegiando a racionalidade. Tornei-me responsável e comprometida com as minhas planilhas interiores, característica que comemoro a cada conquista alcançada. Entretanto, às vezes é preciso colar o ouvido no peito para cessar os ruídos que a gente mesma produz, e escutar algumas vozes tortas que parecem não dizer coisa com coisa. Elas dizem, ô se dizem.